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Resenha: Contos de Clarice - #12mesescomClarice2019

Contos: Mais dois bêbedos, Devaneio e embriaguez duma rapariga e Amor
Autora: Clarice Lispector
  Editora: Editora Rocco
Nota:⭐⭐⭐
Contos lidos para o projeto #12mesescomClarice2019

Sinopse

Dona de uma obra que cruza fronteiras geográficas e de gênero, Clarice Lispector é considerada atualmente uma das mais importantes escritoras do século XX. Nesta coletânea, que reúne pela primeira vez todos os contos da autora num único volume, organizada pelo biógrafo Benjamin Moser, é possível conhecer Clarice por inteiro, desde os primeiros escritos, ainda na adolescência, até as últimas linhas. Essencial para estudantes e pesquisadores, para fãs de Clarice Lispector e iniciantes na obra da escritora, Todos os contos foi lançado nos Estados Unidos em 2015, figurando na lista de livros mais importantes do ano do jornal The New York Times e colecionando importantes prêmios. Agora é a vez de os leitores brasileiros (re)descobrirem por completo esta contista prolífica e singular e seu planeta habitado por bichos, homens e sobretudo mulheres, que se revelam, nas mãos de Clarice, maravilhosos em meio à alegria e ao horror da existência.


Minha opinião

"Mais dois bêbedos"

Clarice sempre surpreendendo.

A primeira coisa que notamos de cara nesse conto, é que diferente dos outros, esse é protagonizado por um homem.


Esse certamente é um dos contos mais curiosos que li de Clarice até agora.

Nele, acompanhamos um homem que após passar de bar em bar resolve puxar assunto com alguém e para sua surpresa é ignorado.

Ele se mantém insistindo por duvidar da existência daquele homem, então decide que irá em busca de algum desconhecido para enfim poder conversar.

"O torpor amolecia, sem cintilações.
Talvez por isso ele custasse tanto a falar.
Mas alguma coisa dizia-me que ele não estava
tão embriagado e que silenciava simplesmente
por não reconhecer minha superioridade."


O que é mais instiga a gente é que ele começa a conversar com um cara com um assunto que ele parecia estar falando previamente e é assim que o conto se torna mais curioso?


Quem será esse homem? Será que ele realmente existe? Ou será que o nosso protagonista está simplesmente questionando coisas sobre a sua própria vida para si mesmo perdido na embriaguez ou de sono?

E Clarice não nos dá essa resposta, o que deixa o conto ainda mais legal, porque por mais que ele te deixe com essa sensação de dúvida, o final do conto é como se o protagonista estivesse despertando.


"Devaneio e embriaguez duma rapariga"

O livro é dividido em partes, e ao finalizar a parte "Primeiras histórias", chegamos à parte "Laços de família" e o primeiro conto é Devaneio e embriaguez duma rapariga.

Aqui acompanhamos uma mulher. Esposa e mãe, resolve tirar um dia de folga da rotina. Todos estranham e acreditam que ela esteja doente.

Ao sair para jantar com seu marido, ela resolve beber e ao ver uma mulher com chapéu se irrita por não estar com um e começa a falar coisas sobre a vida da mulher, apenas presumindo em sua mente, por pura inveja, que ela está usando o chapéu para mostrar que é santinha e que esse é o pior dos tipos.

No dia seguinte ela reflete como o fato de ter bebido no jantar não lhe dar nem o direito de ter ressaca, já que a casa e a família lhes aguarda enquanto todos podem seguir sua rotina descansando como bem entenderem.

"E com seu rico chapéu bem posto.
Pois que bem lhe aproveitasse a beatice!
e que se não lhe entornasse a fidalguia
na sopa! As mais santazitas eram as que
mais cheias estavam de patifaria."

Nesse conto, Clarice nos faz refletir sobre duas coisas: como as pessoas eram dependentes dos serviços da mulher em casa e como as mulheres acabavam criando um rivalidade sem sentido algum.

Veja bem, a mulher em questão gostaria de ter um dia normal sem as cobranças que são feitas a ela por ser mulher, mas ao se deparar com uma em um jantar ela faz exatamente todas as reclamações sem empatia alguma pela outra mulher por causa de um simples acessório.

Clarice nos mostra com esse conto que o pensamento retrógrado da época era tão opressor com as mulheres que as próprias reproduziam isso sem nem sentir.

Ótimo conto para refletir e ver o quanto nós, mulheres, conquistamos e ainda temos a conquistar.


"Amor"

O conto Amor nos apresenta à Ana. Ana é uma mulher rica, casada, mas não abre mão de fazer as compras para casa.

Um belo dia ao sair de bonde para fazer compras ela se depara com um cego em um ponto de ônibus e aquilo mexe demais com ela.


Ela percebe como as pessoas ao redor dele não demonstram nenhuma piedade àquele homem. Ele está ali, cego, na escuridão mascando sem chiclete enquanto todo mundo segue a vida como se nada fosse.

Isso faz Ana refletir sobre como as pessoas podem ficar tão indiferentes e como ela tem uma vida boa e não quer perder nada do que ela tem.

Ela resolve ir até o Jardim Botânico para espairecer mas aquela cena do homem cego mexeu demais com ela. Ela se sente ao ponto de surtar como se tudo pudesse mudar em um segundo na vida dela.


"Cansados do dia, felizes em não discordar,
tão dispostos a não ver defeitos. Riam-se de tudo,
com o coração bom e humano. As crianças cresciam
admiravelmente em torno deles.
E como a uma borboleta, Ana prendeu o instante entre
os dedos antes que ele nunca mais fosse seu."


Em casa, a sensação de emergência a todo momento segue com ela. O medo de perder o marido, o filho ou que qualquer outra coisa possa acontecer com eles.

Mas será que isso tudo seguirá com ela? Ela realmente dará mais valor ao que tem ou será somente uma sensação até um novo amanhecer ou até que presencie algo que lhe faça refletir novamente?


Clarice mais uma vez traz grandes reflexões a se fazer. Como uma coisa cotidiana para os outros pode trazer tanto impacto na vida de uma pessoa que não vivencia aquilo diariamente e que pena é um sentimento estranho porque Ana se acha com todo direito de julgar a falta de piedade dos outros quando na verdade eles só estão deixando o cara viver tranquilamente. Como privilégios mudam os olhares das pessoas... Mais um conto maravilhoso e que recomendo demais!


Finalizo os 12 meses com Clarice 2019 com a visão dos coqueiros do Jardim Botânico descrita por ela no conto Amor e lhes trago a novidade que em 2020 seguiremos com o projeto. No ano do centenário de Clarice Lispector, serão mais 12 contos lidos, digeridos e resenhados aqui e no Café com Leitura, Conduta Literária e Leitura Enigmática.


Muito obrigada pela companhia em 2019, que os contos de 2020 sejam ainda mais significativos e que continuem caminhando conosco nesse ano que será o centenário de Clarice!


Artes novas do projeto para 2020

Você pode adquirir o livro aqui.

Por Amanda Rocha


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4 comentários:

  1. Eu já fui viciada em Clarice Lispector e completamente apaixonada pelo estilo dela. Mas, depois que a internet a reinventou, me afastei e deixei de ler. Esse projeto, no entanto, me levou de volta aos seus contos. Embora aprecie mais as suas crônicas. rs
    Gosto, no entanto, de perceber as figuras femininas pontuadas por um tempo-espaço, que não é o nosso, mas que muitos querem nos devolver para lá. Acho que deveria ser obrigatório (certas figurinhas) ler Clarice para ver se entendem o que queremos ser. Acho que muitas ainda não entenderam o que é o feminismo. Mas, ler Clarice ajudaria um bocadito. rs

    bacio

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    1. Concordo plenamente, Lunna!
      Tem muito a se aprender nas obras de Clarice.

      bacio

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  2. Amiga, que arraso de post! Em dose tripla!!! Você tem me surpreendido a cada dia mais com sua irreverência, e até ouso arriscar, maturidade em seu trabalho! está perfeito! Desde as artes até a escolha dos quotes, a imagem dos Coqueiros do jardim Botânico... Me deu até vontade de ir pra lá!Juro! O último conto ainda não li, mas pretendo até o final de semana! Tem vídeo pra sair a qualquer momento no canal também! Tô adorando estar mais esse ano com vocês no Projeto! Bjs

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    Respostas
    1. Ai amiga, não sabe o quanto isso significa para mim.
      Muito obrigada mesmo!
      Venha sim, amiga, seria um prazer sentar embaixo desses coqueiros para papear com você! :)
      Louca para ver suas considerações e aprender um pouco mais com Clarice nesse projeto lindíssimo que me convidou.

      Beijão!

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